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A Recusa do Fim

“O que é que é a recusa do fim? É quando você já não sabe que você não está dentro, que você não está criando, você não está com líbido, não está com energia. Você está só na inércia. Então, isso é o verdadeiro fim. Isso é a verdadeira perda. Isso é a morte. A morte é quando você está morto, é quando você não tem mais um elo de Eros, não tem um elo erótico com o objeto. Não está fazendo troca que te sustente. É só uma coisa mortificada. Isso é a real morte e já aconteceu. E aí você demora muito para romper esse tipo de relação. Você vai na lógica da inércia e fica dez anos no trabalho, mais uns cinco na relação, no casamento, mais uns vinte falando a mesma coisa e pensando a mesma coisa e se defendendo das mesmas coisas. E essa é a real morte. É a repetição”.

Maria Homem, 2024 (Psicanalista)




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A noção de finitude é um fenómeno intrínseco a todas as dimensões da existência humana. A morte, a perda, o encerramento de ciclos, todas estas constituem-se realidades inevitáveis a cada indivíduo. Contudo, o ser humano tende, muitas vezes, a resistir a esta ideia, adotando inconscientemente uma postura de recusa perante o fim. Esta resistência não se limita à morte física, podendo manifestar-se através do fim de um relacionamento, na perda de um sonho, na conclusão de uma etapa profissional ou de uma identidade que não se sustenta. A resistência ao encerramento de algo, pode refletir um apego excessivo ao passado, uma dificuldade em aceitar a mudança ou numa insistência de manter estruturas que já não servem o bem-estar do indivíduo. É também importante referir que este comportamento é muitas vezes acompanhado por medos: do vazio, da solidão, da perda de controlo, que se não forem compreendidos e trabalhados, podem transformar-se em fontes de sofrimento psicológico, impedindo a sua elaboração e integração.



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Atualmente, a sociedade contemporânea continua a defender a lógica da permanência, do progresso constante, da produtividade sem pausas contribuindo, assim, para uma perspetiva de que o fim corresponde ao fracasso ou algo indesejável. Neste contexto, deixa de haver espaço para a vivência de um luto, de uma pausa ou para o desapego, alimentando uma pressão constante sobre os indivíduos, que se sentem obrigados a manter tudo sob controlo, mesmo quando a vida lhes convida a largar.


É neste sentido que a recusa do fim pode constituir-se numa das formas mais silenciosas do sofrimento psíquico, uma vez que se trata de uma morte subjetiva, emocional e relacional. A vida continua, mas sem desejo, sem presença e sem troca, sendo a existência humana reduzida à repetição e à manutenção do que já não pulsa. Para a autora, a verdadeira morte é a ausência de Eros. Aqui, já não existe investimento libidinal, não há mais desejo, criação ou movimento interno. Contudo, esta inércia é muitas vezes valorizada socialmente, por exemplo: a persistência numa carreira infeliz pode ser entendida como resiliência, a manutenção de uma relação vazia, como compromisso. Ainda assim, todas estas formas podem traduzir-se numa espécie de anestesia existencial. Tudo se sustenta através de uma sobrevivência automática, onde o sujeito se afasta cada vez mais de si.



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Terminar com esta inércia, é algo complexo. Exige escuta, coragem e, muitas vezes, tempo. Implica ainda a existência de um espaço que permita refletir e reconhecer que o fim já ocorreu e que permanecer no mesmo lugar é prolongar uma dor, não só pelo que se perdeu, mas pelo que já não se consegue sentir. É também importante acolher esta resistência, no fundo o fim dói. Contudo, é ainda mais importante aprender a reconhecer quando algo já terminou, mesmo que continue a existir num cenário visível. Por vezes, é na coragem de aceitar a morte simbólica, que se abre espaço para algo novo. É neste contexto que o papel da psicoterapia se mostra como uma ferramenta fundamental durante a vivência deste processo. O acompanhamento psicoterapêutico oferece um espaço seguro, contentor e acolhedor, onde o indivíduo pode explorar os seus medos, elaborar as suas perdas e dar sentido às suas experiências. É através do diálogo, da escuta e da relação empática que se torna possível desconstruir narrativas internas e mecanismos defensivos que já não se ajustam com as necessidades do indivíduo. Cabe ainda ao profissional, ajudar o sujeito a encontrar o sentido da sua existência, a identificar onde ainda existe pulsão de vida, ainda que enfraquecida, promovendo uma postura mais flexível perante a mudança. É neste processo de elaboração e transformação que pode nascer o novo.

 


Estamos aqui, na PSIKIKA, para o ajudar.

91 425 07 10

 

 



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