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Mimos que fazem falta

Com o passar dos anos, muitos animais que outrora eram vistos como selvagens ou destinados a desempenhar funções específicas como caçar, guardar o gado ou servir de meio de transporte, tornaram-se, mais do que nunca, companheiros. Esta evolução conduziu à formação de um vínculo profundo entre seres humanos e animais.


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Atualmente, muitas pessoas consideram os seus animais de estimação como membros da família, integrando-os plenamente na rotina e dinâmica do lar. Vivem com eles dentro de casa, partilham a cama, viajam juntos, cuidam da sua alimentação e, acima de tudo, constroem uma ligação afetiva profunda.


Contudo, tal como acontece entre seres humanos, também a relação entre os donos e os seus animais varia de pessoa para pessoa. Segundo Sife, existem três tipos de vinculação visíveis: uma vinculação fraca, na qual o dono se limita a fornecer o necessário ao animal, como comida e higiene; uma vinculação moderada, em que o dono passa mais tempo com o animal e compreende melhor as suas necessidades; e uma vinculação profunda, caracterizada por um envolvimento emocional forte, em que os donos sabem convictamente o que os seus animais precisam e sentem. Os donos deste último grupo consideram o animal como um membro da família e vivenciam com grande dificuldade o luto após a sua morte.



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Apesar da profundidade do vínculo, o luto por um animal é frequentemente desvalorizado socialmente. São diversas as situações onde o luto não é compreendido e aceite por aqueles que rodeiam o dono, havendo menos espaço para que esses expressem os seus sentimentos. Ainda assim, a morte de um animal de companhia pode ser tão devastadora quanto a perda de um ente querido, considerando que os animais, para além de serem sentidos como membros da família, ocupam um espaço na rotina dos seus donos. O amor incondicional, a presença constante e o sentimento de valorização que os animais proporcionam, tornam-se fontes regulares de afeto e validação. Quando esta presença se perde, a pessoa pode experienciar uma rutura significativa na sua estabilidade emocional.  


Entre as pessoas que criam um vínculo profundo com os seus animais de estimação, algumas tornam‑se especialmente suscetíveis a um luto mais intenso quando estes morrem. É o caso, por exemplo, de indivíduos socialmente isolados ou com poucas relações, para quem o animal representa uma fonte essencial de companhia e afeto. Noutros casos, a perda do animal pode funcionar como gatilho emocional, reacendendo lembranças de outras perdas significativas ao longo da vida.

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Para além disso, é importante considerar que a morte de um animal pode ocorrer em diferentes circunstâncias, como acidentes, doenças ou através da eutanásia, em casos de sofrimento prolongado. Quando a eutanásia é apresentada como opção, os donos enfrentam uma decisão extremamente difícil: escolher entre proporcionar qualidade de vida ao animal nos seus momentos finais ou prolongar um pouco mais a sua vida, muitas vezes guiados pelo desejo de não o perder. Nestes contextos, é frequente emergirem sentimentos intensos de culpa, seja por não terem detetado uma doença mais cedo, ou por se sentirem diretamente responsáveis pela morte do seu companheiro.



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Neste sentido, alguns estudos têm demonstrado uma associação entre o luto pela perda de um animal e sintomas de depressão generalizada, especialmente quando a morte ocorre de forma súbita, como em casos de acidente ou doença rápida, sem possibilidade de eutanásia. Nestes casos, a ausência de preparação para a perda pode intensificar a dor emocional. Para além disso, há donos que apresentam manifestações emocionais na linha da Perturbação de Luto Prolongado, que incluem tristeza intensa, dificuldade em aceitar a perda e perturbações no funcionamento diário que persistem por mais de 12 meses.


Perante esta realidade, torna-se fundamental reconhecer o luto pela perda de um animal como um processo legítimo e profundamente doloroso. A ausência de validação social pode intensificar o sofrimento, dificultando a adaptação emocional e o percurso natural do luto.



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Por isso, é essencial que familiares, amigos e até profissionais de saúde mental estejam atentos a esta dor, oferecendo espaço e apoio para que os donos possam expressar livremente os seus sentimentos. Promover uma maior consciência social sobre a profundidade destes vínculos e sobre o impacto da perda pode ajudar a combater o estigma e a criar redes de suporte mais empáticas e eficazes para quem vive esta experiência.



Tags: Luto Animal, Luto Desvalorizado, Vinculação, Amor Incondicional, Psicologia, Laços, Família;

 

 

Referências:

Adams, C. L., Bonnett, B. N., & Meek, A. H. (2000). Predictors of owner response to companion animal death in 177 clients from 14 practices in Ontario. Journal of the American Veterinary Medical Association217(9), 1303-1309.

 

Messam, L. L. M., & Hart, L. A. (2019). Persons experiencing prolonged grief after the loss of a pet. In Clinician's guide to treating companion animal issues (pp. 267-280). Academic Press.

 

Rujoiu, O., & Rujoiu, V. (2013). Human-animal bond: Loss and grief. A review of the literature. Revista de Asistenta Sociala, (3), 163.

 

Stokes, S., Planchon, L., Templer, D., & Keller, J. (2002). Death of a companion cat or dog and human bereavement: Psychosocial variables. Society & Animals10(1), 93-105.

 

Psikikamente,

IG

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