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O fumo que nos cega - Quando o cigarro é para além de nicotina.

"Por favor, reflete sobre a tua vida. Alguma vez tomaste, de forma consciente, a decisão positiva de que não conseguirias desfrutar de uma refeição ou de um momento social sem fumar? Ou que não serias capaz de te concentrar ou lidar com o stress sem um cigarro? Em que momento decidiste que precisavas de cigarros, não apenas para ocasiões sociais, mas que tinhas de os ter sempre contigo, sentindo-te inseguro, ou até em pânico, sem eles?"                        

Allen Carr


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De acordo com a OMS o tabagismo está associado a inúmeras doenças como o desenvolvimento de cancro em diversos órgãos do corpo, nomeadamente nos pulmões, doenças cardíacas, problemas respiratórios e problemas de saúde reprodutiva. Tal, deve-se ao facto de o tabaco conter alcatrão, monóxido de carbono, nicotina e outros químicos que são tóxicos, aditivos e cancerígenos. Consequentemente, estima-se que por ano o tabaco seja a causa de 8 milhões de mortes que poderiam ser evitáveis.


Apesar deste conhecimento e do aumento da atenção face ao tema através de publicidades antitabaco, fumar continua a ser um hábito comum e socialmente tolerado.


Mas então porquê?



Em primeiro lugar, porque é que fumar é viciante? 


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A nicotina, principal substância psicoativa do tabaco, provoca mudanças no cérebro ao interagir com os recetores nicotínicos de acetilcolina. Estes são proteínas localizadas na superfície dos neurónios e são normalmente ativadas por um neurotransmissor chamado acetilcolina. Contudo, quando a nicotina é inalada através do cigarro, ocorre um fenómeno de upregulation, ou seja, uma regulação positiva desses recetores, com um consequente aumento do seu número, como forma de o cérebro se adaptar à estimulação constante que ocorre. Além disso, estes recetores estão ligados ao sistema dopaminérgico, responsável pela libertação de dopamina, uma substância que atua em áreas do cérebro associadas ao prazer e à motivação. Com o tempo, estas alterações tornam o cérebro mais sensível à nicotina e reforçam o efeito de dependência.


Por outro lado, a par do efeito químico, a dependência está também associada a uma forte componente psicológica, que pode ser mais dura do que a dependência física. Muitos fumadores associam o fumar a momentos de relaxamento, socialização ou alívio emocional. Um café, uma pausa no trabalho ou um momento de maior stress podem ser gatilhos que ativam o desejo de fumar.


Se o efeito negativo do tabaco é reconhecido, porque é que as pessoas continuam a fumar?


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Apesar de todo o conhecimento disponível sobre os efeitos negativos do tabaco na saúde, muitos fumadores continuam a fumar, mesmo conscientes do mal que a sua dependência lhes provoca. Esta persistência pode ser explicada pelo fenómeno da dissonância cognitiva, na qual o individuo se confronta com uma incoerência entre os seus comportamentos e as suas crenças. Para reduzir essa incoerência, muitos fumadores recorrem as crenças que justifiquem os seus comportamentos, como, por exemplo “há coisas piores” ou “o meu familiar fumou e viveu até aos 80 anos”. Estas crenças funcionam como mecanismos de defesa para manter o hábito sem enfrentar diretamente a ameaça percebida, reduzindo, assim, a perceção do risco e diminuindo a motivação para abandonar o tabaco.


Deste modo, é essencial desafiar estas crenças de modo a promover a cessação tabágica, mas de forma cuidadosa, evitando provocar reações defensivas que possam reforçar ainda mais essas mesmas crenças. Assim, estas devem ser contrariadas com argumentos que as desafiem diretamente e que desmontem os mitos associados. A ideia de que “há fumadores que chegam aos 80 anos” ignora o facto de que a maioria não o faz – dois em cada três fumadores morrem de doenças relacionados com o tabaco, muitas vezes antes dos 70 anos. Para além disso, deve-se incentivar simultaneamente o envolvimento em processos de mudança eficazes, como a tomada de consciência acerca da dependência e dos riscos, o apoio interpessoal e sugestões práticas e alternativas viáveis.


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Posto isto, é importante olhar para quem fuma, não como um responsável, mas como uma vítima de um vício que ultrapassa a simples força de vontade. Fumar não é apenas uma escolha isolada, é o resultado de uma dependência profundamente enraizada, sustentada por processos químicos, psicológicos e por uma aceitação social que, embora tenha vindo a ser desafiada, ainda persiste.


Esta normalização é, em si, um paradoxo. Vivemos numa sociedade que condena o tabaco nos discursos formais, mas tolera na prática. Pequenos passos têm vindo a ser dados, mas continuam a ser insuficientes. Mais do que combater o cigarro como produto, é fundamental confrontar a aceitação social que o sustenta.


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Tratar o fumador como uma vítima não é retirar-lhe a responsabilidade, mas sim reconhecer que a responsabilidade maior deve recair sobre os contextos que normalizam o hábito, as indústrias que o alimentam e os sistemas que oferecem poucas alternativas. É preciso que as mortes evitáveis, tantas vezes apontadas pelas OMS, sejam de facto evitadas…


Se fumas ou conheces alguém que fuma, procura ajuda. Fumar não é apenas um hábito, é uma dependência real que pode ser superada. Se não souberes por onde começar, deixamos-lhe algumas sugestões:




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Estamos aqui, na PSIKIKA, para o ajudar.

91 425 07 10




Psikikamente,

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Tags – Fumar; Adição; Vício; Dependência; Psicologia; Controlo; Hábitos; Doenças; Dissonância Cognitiva;


Referências

  • Buisson, B., & Bertrand, D. (2001). Chronic exposure to nicotine upregulates the human α4β2 nicotinic acetylcholine receptor function. Journal of Neuroscience21(6), 1819-1829.

  • Carrillo-Sierra, S. M., Cárdenas-Cáceres, L., Cadrazco-Urquijo, J. A., Salazar-Gómez, A. N., Rivera-Porras, D., & Bermúdez, V. (2024). Psychological Therapies Used for the Reduction of Habitual Cigarette Smoking Cigarette Consumption: A Systematic Review. International Journal of Environmental Research and Public Health21(6), 753.

  • Fluharty, M., Taylor, A. E., Grabski, M., & Munafò, M. R. (2016). The association of cigarette smoking with depression and anxiety: a systematic review. Nicotine & Tobacco Research19(1), 3-13.

  • Kleinjan, M., van den Eijnden, R. J., Dijkstra, A., Brug, J., & Engels, R. C. (2006). Excuses to continue smoking: The role of disengagement beliefs in smoking cessation. Addictive behaviors31(12), 2223-2237.

  • World Health Organization. (2014). The effects of tobacco use on health. In The effects of tobacco use on health.

  • Wittmann, M., Paulus, M., & Roenneberg, T. (2010). Decreased psychological well-being in late ‘chronotypes’ is mediated by smoking and alcohol consumption. Substance use & misuse45(1-2), 15-30.








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