Numa altura em que a sociedade valoriza a centralização da vida das pessoas em torno
do trabalho, o equilíbrio e a divisão entre a vida profissional, pessoal e o lazer é
essencial termos autocuidado.
A investigação tem incidido sobre o autocuidado,
o qual tem definições distintas com base nas diferentes perspetivas. Apesar das suas
diferenças, estes conceitos apresentam aspetos comuns e transversais entre eles,
nomeadamente a ideia de cuidado consigo próprio.
O autocuidado foi um termo originalmente relacionado com o movimento dos 12 passos
e tem sido adotado por psicólogos e profissionais de saúde. Trata-se de um construto
genérico e individual e conceptualizado enquanto prática de uma rotina positiva
associada à consciencialização do indivíduo para o seu self físico, emocional, relacional
e espiritual, no contexto da sua vida pessoal e profissional. Esta rotina integra não só
atividades e estratégias para promover e manter o bem-estar físico e emocional como
tentar minimizar os efeitos do distress e prevenir o impairment, isto é, o
comprometimento e degradação de uma prática profissional competente. Estas
estratégias são usadas enquanto mecanismos de coping eficazes e adequados para a
gestão e minimização dos riscos e stressores associados à profissão, salientando-se
ainda a redução de estratégias desadaptativas que resultam num agravamento das
dificuldades do indivíduo.
A prática da psicologia clínica é, por natureza, o cuidar do outro. Neste sentido é
possível constatar o carácter bidirecional do processo terapêutico, dado que não só os
profissionais influenciam os clientes, como estes têm também grande impacto na vida
dos terapeutas. O envolvimento emocional experienciado por parte dos psicólogos,
associado ao desgaste proporcionado pela prática clínica, pode impactar
significativamente o contexto pessoal do terapeuta, visto não ser possível demarcar
nitidamente uma linha que separe a sua vida profissional da vida pessoal.
Dada a grande carga emocional que a prática da psicologia clínica abarca, os psicólogos
devem tentar gerir de forma eficaz e proactiva os desafios da sua profissão. É aqui que
surge o autocuidado, que pode ser realizado com o apoio de outros profissionais de
saúde, de modo a dar resposta às necessidades sociais e psicológicas dos indivíduos. Os
psicólogos adotam estratégias de autocuidado que se focam no seu bem-estar emocional
e psicológico, cujas competências e comportamentos promovem a sua saúde e qualidade
de vida e enfrentam algumas condições de desgaste associadas à sua profissão.
As estratégias de autocuidado servem, então, como meio para neutralizar os efeitos
negativos da prática clínica e aumentar a resiliência dos psicólogos contribuindo para
que consigam trabalhar de modo competente e eticamente responsável. Assim, o
autocuidado não deve ser tido como um extra ou luxo na vida dos profissionais,
satisfeito apenas quando o tempo o permite. Trata-se de uma necessidade clínica,
requisito humano e imperativo ético na prática eficaz da profissão, visto que facilita o
crescimento pessoal e profissional e associa-se à competência dos mesmos.
Em suma, o autocuidado refere-se a um construto de carácter preventivo e uma natureza
intencional sendo a prática mais importante quando toca à prevenção dos potenciais
efeitos do stress, do distress e do impairment, sendo unânime nas diversas teorias, a
importância atribuída à necessidade de desenvolver estratégias dirigidas à promoção de
saúde, principalmente em profissionais que trabalham diretamente com o sofrimento
dos outros. Ainda assim, e apesar da importância conferida ao autocuidado, os
psicólogos têm ainda a tendência de o desvalorizar quando se trata à sua saúde mental e
a estar atentos aos sinais de burnout, distress, denotando-se o estigma em pedir ajuda.
De modo a combater estes efeitos, é de extrema importância que se invista na
consciencialização e educação dos estudantes de psicologia e dos próprios profissionais
para o autocuidado.
Por fim, o autocuidado diz respeito a um processo intencional que engloba a
autorreflexão e a adaptação de estratégias às necessidades individuais, experiências e
valores pessoais. É, então, um processo multifacetado e multidimensional que abrange
as áreas distintas da vida profissional e pessoal e tem como objetivo final a promoção de
um funcionamento saudável e o aumento do bem-estar. É, portanto, essencial que os
profissionais reconheçam a necessidade de cuidar da sua saúde física e mental, fazendo
deste objetivo uma prioridade sua e integrando estratégias de autocuidado tanto na sua
vida pessoal, como na profissional.
“De que adianta cuidar dos outros se nos esquecemos de nós mesmos?”
Saudações Psikikas.
C.T.
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