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AS CRIANÇAS E O MEDO DOS MEDOS

Numa explicação mais biológica, é importante pensarmos no medo como uma emoção básica, fundamental, presente em todas as idades, culturas, raças ou espécies. Sim, todos nós já sentimos medo nas mais diversas situações. Quando um estímulo externo indica uma situação perigosa, este é percebido pelo cérebro, que envia uma mensagem, deixando a pessoa mais alerta e atenta ao seu ambiente. Tratam-se de respostas automáticas, ou seja, que não temos tempo para as avaliar de forma consciente no momento em que acontecem. Paralelamente, existem reações físicas imediatas associadas à preparação para a ação, ou seja, para fugir, bloquear ou lutar contra a ameaça percebida. Estas reações podem ser a aceleração da frequência cardíaca e/ou da respiração, dores de barriga, aumento da pressão sanguínea, suores, etc... Assim, o nosso sistema nervoso está preparado para desencadear uma reação fisiológica a algo que seja ameaçador, sendo que a resposta pode ser desencadeada devido a ameaças reais ou imaginárias.
Dos 0 aos 12 meses: as crianças habitualmente têm medo de lugares e pessoas estranhas;
Entre os 2 e os 3 anos: é quando a criança ao ter contato com o mundo tem medo de ser esquecida na escola (abandonada), por exemplo, vendo ainda os pais como o único e exclusivo porto seguro das suas vidas. (Quando uma criança tem medo da separação, por exemplo, é importante transmitir-lhe rotinas previsíveis de separação e reencontro, ou seja, dizer quando se vai embora e quando irá voltar, cumprindo com esses horários. Assim irá transmitir confiança e segurança à criança. O mais importante é que ela sinta que vai conseguir ultrapassar os seus medos);
Entre os 2 e os 4 anos: é natural a criança ter medo do escuro e de barulhos, assim como de ficar sozinha e de se separar dos pais.
Entre os 4 e os 7 anos: a criança normalmente tem medo de dormir sozinha, de monstros, pessoas mascaradas e seres sobrenaturais, assim como de cães ou outros animais, de ladrões ou de perder-se e magoar-se ou ainda que algo de mal aconteça aos seus pais;
Entre os 8 e os 12 anos: as crianças estão mais voltadas para os perigos da realidade, apresentando medo de tempestades ou catástrofes naturais, a perda de um familiar e/ou alguém próximo, o desempenho escolar e ainda o medo de não ser aceite socialmente pelo seu grupo de pares.

Na realidade todos nos conseguimos rever em situações como a descrita anteriormente, quer seja por algo do qual percepcionamos que nos irá fazer mal ou prejudicar, quer como uma resposta de insegurança perante o desconhecido. O medo é, assim, um processo adaptativo que faz parte do normal desenvolvimento da criança, sendo que há medos característicos de cada etapa do desenvolvimento infantil pelas experiências e situações vivenciadas pela criança.
Importa salientar que o desenvolvimento é um processo dinâmico e evolutivo, sendo que cada criança tem o seu próprio tempo e ritmo, não sendo, por isso, os medos descritos estanques às idades referidas, podendo prolongar-se no tempo. Ainda assim, alguns desses medos tendem a dissipar-se ou a minimizar-se com o tempo.
Mas, afinal, quando é que os medos começam a afetar o normal desenvolvimento das crianças?
Tal acontece quando estão associados a uma preocupação intensa ou ansiedade duradoura, com um impacto negativo no desenvolvimento normal da criança, interferindo no seu dia-a-dia. São, portanto, sinais de alerta quando se trata de um medo intenso e persistente, que interfere com a alimentação, sono, atividades diárias, etc... da criança, que não corresponda com os medos associados à sua idade cronológica ou do seu normal desenvolvimento e no qual haja uma regressão do comportamento e do desenvolvimento da criança. Quando os receios passam a medos, pela intensidade, e os medos não são trabalhados, podem vir a impossibilitar o normal quotidiano da criança, podendo tornar-se fobias. Quando tal acontece é fundamental procurar ajuda psicológica de forma a ajudar a sua criança a lidar da melhor forma com os seus medos, de modo a que isso não a prejudique no seu dia-a-dia.

Posto isto, o que pode fazer quando se apercebe que a sua criança está a passar por uma situação que lhe causa medo ou desconforto? Em primeiro lugar, importa valorizar sempre os seus sentimentos, acolhê-la e ajudá-la a ultrapassar o problema de forma positiva, sendo, assim, fundamental transmitir segurança, amparando-a e apoiando- a. É igualmente fundamental abrir espaço para que a criança possa verbalizar os seus medos num espaço seguro e contentor, sem que sinta sentimentos de vergonha ou rejeição.
É também essencial que não repreenda nem castigue a criança pelos seus medos, para que esta não se sinta ainda mais ansiosa. Pelo contrário, sempre que a criança conseguir enfrentar o seu medo, reforce a sua confiança e segurança de que irá conseguir ultrapassar os seus medos.
Se sente que, ainda assim, o problema da criança persiste, deve procurar um profissional na área da saúde mental, nomeadamente um psicólogo, de forma a que a sua criança consiga lidar melhor com os seus medos, evitando que estes se possam tornar numa situação mais complexa que pode afetar o desenvolvimento da criança.
Com um até já Psikiko!
J.C.